O conselho profissional de Educação Física,
Sistema CONFEF-CREFs, criado a partir da
Lei nº 9.696/98, vai debutar no próximo domingo, 1/9, completando 15 anos de existência. Há o que comemorar?
"Multiplicam, em todo Brasil, as ações na justiça federal questionando o Sistema CONFEF-CREFs. Numa visão fria, distante dos dirigentes que fazem de tudo para se perpetuarem no poder, vejo a revolta dos Profs. de Educação Física, dirigida à falta de políticas e atitudes que venham de encontro às necessidades da grande massa -
os trabalhadores, professores que labutam dia após dia em jornadas de
12, 15 horas diárias"
A denúncia bem que podia ser de alguém contrário à regulamentação, mas é assinada pelo professor
Ernani Contursi, um dos fundadores do Sistema e primeiro presidente do
CREF 1.
Segundo o último
Censo da Educação Superior divulgado, são 1.058 os cursos de Educação Física no país, dentre os quais, 663 licenciaturas e 395 bacharelados. Foram formados por estes cursos, só em 2011, um total de 22.958 licenciados e 11.499 bacharéis. Será que são muitos?
Já conforme dados do
Censo Escolar, em 2012, haviam mais de 2 milhões de professores atuando na educação básica no Brasil, 25% deles, perto de 500 mil, sem ensino superior. Não consegui acessar os números relativos aos professores de Educação Física pelo Censo, mas a
Pesquisa do IBOPE encomendada pelo Instituto Ayrton Senna, Instituto Votorantim e Atletas pela Cidadania indica que entre 17 e 22% deles não são formados na área.
Isto quer dizer que as aulas de Educação Física na escola, em grande medida, são dadas por professores com outra formação ou sem formação superior. Mas isto não significa que eles têm de ser presos por exercício ilegal da profissão. A rigor, a despeito das investidas políticas e jurídicas do Sistema CONFEF-CREFs, quem regula o sistema de educação brasileiro é o MEC e nenhum professor tem de ter registro profissional, mas sim o reconhecimento do diploma. Esses professores sem formação específica necessitam é de políticas públicas que garantam seu acesso e permanência no ensino superior.
Quando lhe são oferecidas as condições, é o que buscam, formar-se. Como revela o Censo Escolar, do total de professores de Educação Física atuando na escola sem diploma, 15.775 estavam cursando a licenciatura na área.
Sim, os licenciados tem onde trabalhar, o país precisa de mais professores. Mas e fora da escola, o que acontece?
O CONFEF vem restringindo o campo de atuação de licenciados, postura questionada na justiça pelo
Ministério Público Federal. Para o Conselho, a atuação em academias de ginástica,
personal trainner, clubes esportivos, hospitais,
spas, hotéis etc é permitida somente ao bacharel.
De todo modo, independente da judicialização em questão, afora o chão da escola, o maior mercado que tem se apresentado e atraído os egressos dos cursos de Educação Física é o setor de academias e do fitness.
Como o mercado cresce, supostamente, crescem também as oportunidades de emprego. Há um
gap muito grande nesta área, gerando grande demanda por profissionais especializados, é o que divulga o
Portal da Educação Física.
Agora, se o professor de Educação Física - sem desconsiderar a luta constante por melhores salários e condições de trabalho - está relativamente bem amparado na escola em termos de garantias trabalhistas e organização sindical, o que se assiste no mercado do fitness é um avançado processo de estagiarização e precarização.
A fixação do salário de admissão para mensalistas fixado em R$ 800,00 - abaixo do
piso salarial dos professores, em 2012, de R$ 1.451 - e horistas em R 4,00 , por si só, já é aviltante. Mas o acordo permite também a remuneração via gratificação, o regime temporário, parcial ou autônomo e o trabalho em domingos e feriados, sem falar de outras perdas.
O CONFEF, por sua vez, finge de morto. Separa o caracol da sua concha e diz que a discussão em torno do trabalho não é com ele. Cada um no seu quadrado, defende que o papel dos conselhos profissionais é discutir a profissão.
Após receber aporte da gestora de investimentos
Pátria, seguindo a tendência de centralização e concentração do capital, a já estabelecida rede de academias
Bio Ritmo, lançou uma segunda marca, a Smart Fit, com mensalidades a partir de R$ 49,90
reais. Seu diferencial: não fornece o serviço de profissionais
para acompanhamento durante a prática de exercícios.
Temendo a concorrência, quem foi para cima da Smart Fit foi o SINDACAD-RJ, denunciando
dumping predatório por parte da Rede e inserindo na convenção coletiva de trabalho de 2010 o limite de 50 clientes para supervisão de um profissional de Educação Física. A Smart Fit contra-atacou. Abriu processo junto ao CADE contra o Sindicato das Academias e, ironicamente, quem lhe deu munição foi justamente o CONFEF.
"
Note-se que o Conselho jamais editou resolução que estabelecesse uma regra relativa ao número de profissionais de educação física que as academias devem contratar com base no número de clientes. A Resolução 21/2000 determina nesse sentido tão somente que: “as pessoas jurídicas prestadoras de serviços em atividades físicas, esportivas e similares (...) tem o dever legal de assegurar que as prestações desses serviços sejam desenvolvidas de forma ética, sob a responsabilidade de profissional devidamente inscrito no Conselho Regional de Educação Física”. Da leitura, infere-se que o CONFEF exige de uma academia de ginástica apenas a manutenção de ao menos um profissional graduado em educação física como responsável técnico no estabelecimento", assim se pronunciou o
Departamento de Defesa Econômica.
De um lado, o Conselho
ameaça prender licenciados, de outro, publicamente solta um tímido
alerta de risco a saúde para, na surdina, manifestar-se de modo conivente com a comercialização de serviços de
fitness sem orientação profissional. Fala grosso com os fracos e pia fino com os poderosos, essa é sua prática.
Se conselho fosse bom, não se dava, vendia-se, é o que diz o ditado popular. E o CONFEF leva isto ao pé da letra. Para se registrar, o profissional tem que pagar uma anuidade de R$ 380,00 e as academias R$ 950,00. É certo que o pagamento compulsório da anuidade não caracteriza uma relação de compra e venda, mesmo porque, se o fosse, teria muita gente reclamando no PROCON. Mas é este "imposto" que sustenta o Sistema.
Tá lá escondidinha em sua
página a prestação de contas de 2011 - esta vai ficar sem
link direto para ver se você consegue achar. Sem contar a receita dos CREFs, só o CONFEF arrecadou o valor de R$ 11.543.890,59. Como seu
estatuto diz que do total da arrecadação 80% fica com os CREFs e 20% centralizado no CONFEF, presume-se que o Sistema arrecadou naquele ano algo na casa dos R$ 50 milhões de reais.
Como o demonstrativo é pra lá de simplificado, fica impossível analisar o direcionamento dos gastos. Não por acaso, as suspeitas aparecem:
"A proximidade das eleições no CONFEF abriu os cofres para festas e reuniões mensais em paraísos turísticos, principalmente no nordeste. Nos treze anos de existência nunca foi realizada uma reunião de presidentes e conselheiros do CONFEF no nordeste! Em 2012, ano de eleição, já foram quatro!!! Após uma festa aqui, em Foz do Iguaçu, outra festa acolá, em João Pessoa, reuniões mensais com jetons e diárias somadas, e todos apóiam o continuísmo", é o que denuncia mais uma vez o
conselheiro dissidente.
É, o ômi não larga o osso. Mumificado no poder desde a criação do Sistema, em 1998,
Jorge Steinhilber, presidente do Conselho, foi mais uma vez reeleito em 2012. Quando 2016 chegar, serão 18 anos a frente do CONFEF.
Tive a curiosidade de checar a realidade de outros Conselhos. Desde o mesmo ano de 1998, passaram pela
OAB 6 presidentes. No
CFM foram 3, no
CONFEA 5 e no
CFESS também 6.
O ethos político do Sistema CONFEF-CREFs não combina com o ethos de um conselho profissional, o que se justifica, talvez, por sua origem e ligação com o mundo esportivo. Sim, a Educação Física engravatada está bastante identificada com a cartolagem do esporte.
“Sem querer ser arrogante nem melhor ou pior do
que ninguém, é preciso lembrar que não havia e não há ninguém tão
preparado para esse cargo como eu. Não concordo com o projeto apoiado pelo governo que limita o mandato dos dirigentes esportivos. Certas batalhas levam tempo e demandam experiência para ser vencidas. Não sou insubstituível, mas meu perfil é único."
Não só o presidente, mas boa parte dos conselheiros que dirigem o Sistema CONFEF-CREFs também se acham os caras, únicos, e seguem se perpetuando, sustentando-se por um complexo sistema eleitoral que inibe a criação de oposições e impede a renovação e alternância no poder, alguns deles, já ostentando o nobre título de Conselheiro Honorífico Vitalício do Sistema.
Não às ingerências do Sistema na escola!
Por melhores condições de trabalho para o Profissional!
Por participação, transparência e democracia!
Muda CREFs! Muda CONFEF!