quinta-feira, 19 de setembro de 2013

Agora vai!




O improvável aconteceu. Primeiro foi a Câmara, na semana passada, e, nesta última terça-feira - 17/9,  foi a vez do Senado. Aprovaram regras que impõem democratização, participação e transparência às entidades esportivas. 

Agora está nas mãos da Dilma. O projeto de lei de conversão PLV 22/2013, oriundo da medida provisória MP 620/2013, seguiu para sanção presidencial.

Apelidada como "MP do Minha Casa Melhor", quando entrou em tramitação na Câmara, a MP 620 recebeu várias emendas, dentre as quais, a chamada "emenda do esporte".

Tal medida, vigorando desde de junho, autorizou a capitalização da Caixa Econômica Federal para abertura de crédito voltado à compra de móveis e eletrodomésticos pelos beneficiários do Minha Casa Minha Vida. Além disso, a MP tratava também do prazo para que os impostos comecem a ser informados nas notas fiscais e do Vale-Cultura.

Já como PLV, outras mudanças foram embutidas na MP, com destaque para as regras de certificação de filantropia a comunidades terapêuticas, entidades de educação e entidades de assistência social.

No que se refere ao esporte, a MP 620 altera a Lei Pelé, com a inclusão de um novo artigo que estabelece uma série de condicionalidades para o repasse a entidades esportivas de recursos da administração pública federal direta e indireta. 

Na prática, a principal mudança é que as entidades esportivas - de prática e de administração - que receberem verba federal, e são quase todas, não poderão eleger um mesmo dirigente por mais de dois mandatos seguidos, com duração de quatro anos cada um. 

Estabelece ainda a garantia estatutária de participação de atletas nos colegiados de direção e na eleição para os cargos das entidades e garante transparência na gestão financeira, dando visibilidade inclusive aos contratos com patrocinadores e de direitos de imagem, até então, uma caixa-preta das entidades esportivas.

Há de se registrar que o protagonismo de atletas e ex-atletas que se organizaram através da associação Atletas pela Cidadania. A entidade é presidida por Ana Moser e reúne gente como Mauro Silva, Cafu, Raí, Lars Grael, Hortência, Magic Paula, Fernando Meligeni, Guga, Gustavo Borges, Joaquim Cruz, dentre outros. 

Na onda das Jornadas de Junho, que questionaram também os gastos com a Copa, a partir do Manifesto dos Atletas por Legado Social e Esportivo de Megaeventos, a associação subiu o tom:

"Felizmente, o país hoje clama por mudanças. A agenda pública deve se balizar pelo que seu povo decide e não só pelo que seus governantes acreditam que sejam as prioridades (...) Nós, Atletas pela Cidadania, somos contra a destinação de recursos públicos para benesse de alguns, as remoções que violam os direitos humanos, a corrupção e a falta de transparência nas decisões e nas contas (...) Repetimos: há mais de dois anos apresentamos uma agenda positiva ao país, com dois pontos centrais para o Legado Esportivo e Social da Copa e das Olimpíadas: o Esporte acessível a todos os brasileiros e a urgente revisão do Sistema Esportivo Nacional. As diretrizes são claras. Limitar o mandato de dirigentes esportivos, definir os papéis e integrar os entes federativos, abrir à participação democrática de atletas, qualificar educadores e profissionais esportivos permanentemente, ampliar a infraestrutura esportiva pública."

Concordo com Raí, foi o povo nas ruas que criou o clima para aprovar o limite para a reeleição dos cartolas. Aproveitando, ele e Ana Moser foram à TV, pautaram as diretrizes do manifesto na mídia e, desde então, junto aos seus colegas, valendo-se do prestígio e visibilidade que possuem, propuseram e pressionaram o Congresso pela aprovação da emenda.

Para quem não acreditava, o Juca Kfouri anunciou: Golaço, pontaço, cesta de três pontos ou marcas históricas no Senado. Escolha! Em sua análise, houve reação do COB e Confederações, mas três mulheres, a própria presidenta, a ministra Ideli Salvatti e a senadora Ana Rita - PT-ES, que relatou o PLV, juntas, articularam apoio à aprovação da Medida.  

Tudo indica que a medida, na forma de lei, vai ser sancionada. E se não receberem veto da presidenta, as novas regras entrarão em vigor em seis meses.

No ano passado, o ministro Aldo Rebelo já havia defendido a limitação de mandatos nas entidades esportivas, disse que isso poderia ser feito por regulamentação do próprio Ministério do Esporte, mas não levou a mudança adiante. Desta vez, mesmo diante da movimentação dos atletas e ex-atletas, manteve-se em silêncio. 

Nuzman, que planejava um sexto mandato, tendo confidenciado a outros cartolas seu desejo de se recandidatar mais uma vez para presidência do COB em 2016, ainda não se pronunciou. 

Outros dirigentes saíram atirando:

"É de estranhar que os atletas que tanto falam em democratizar as confederações usem uma carona (a MP) para regular isso. Não fomos chamados para opinar. O tempo ideal de mandato na entidade é de 12 a 16 anos”, criticou Alaor Azevedo, presidente da Confederação Brasileira de Tênis de Mesa - CBTM.

O argumento do "Cavalo de Troia" foi o mesmo da CBF. O fato é que a "emenda do esporte" foi embutida em várias MPs. O lobby da CBF e conseguiu derrubar a emenda na aprovação da MP 615/2013, mas não conseguiram barrá-la na tramitação da MP 620/2013 e, como salvaguarda, a proposta estava emendada também na MP 621/2012.  

Por fim a CBF se resignou. Como o texto da emenda é dúbio em relação à entidade e havia outro projeto de lei mais explícito em relação a ela em tramitação no Senado, o PLS 253/2012, resolveram entregar os anéis para não perder os dedos.

Mas para o advogado que assessorou os Atletas pela Cidadania e deu redação a "emenda do esporte", as mudanças também apanham a CBF. Embora não receba verbas públicos, a entidade é isenta de tributos incidentes sobre a receita. Assim, caso ela não se adapte às condicionalidades da nova lei, perderá a isenção fiscal da qual atualmente se beneficia.

Pode ser que alguém diga que comemorar e apoiar tal mudança é coisa de juridicialista e reformista. Eu comemoro e apoio. Considero que as regras de democratização, participação e transparência impostas às entidades esportivas pela nova lei, caso se confirme sua sanção, representam um avanço institucional importante para o mundo do esporte.

Sei que não basta só estatuir novas regras, mas num ambiemte onde ainda prevalece a antidemocracia, esta é uma condição necessária.

O que hoje é praticamente impossível, o surgimento e organização de oposições à cartolagem mumificada no poder, passará a ser possível. Isto pode provocar mudanças no status quo autoritário do setor. Além disso, no médio prazo, legalidade, moralidade, publicidade e eficiência podem se tornar também princípios da organização esportiva nacional. Enfim, quem viver verá. Estamos diante da possibilidade de mudanças que não são pouca coisa. 

Pela democracia, participação e transparência nas entidades esportivas!
Sanciona, Dilma!

2 comentários:

  1. Fernando
    Mais uma vez o saúdo pela oportunidade e lucidez dessa matéria.
    Fecho fileira com você quando defende a importância da luta no campo jurídico, percebendo-a como parte constitutiva de uma mesma unidade,a qual tem a luta no campo político como sua outra face, mostrando sua complementariedade e não antagonismo como pensam alguns equivocados.
    Parabéns!
    Abraços
    Lino

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    1. Opa Lino, mais uma vez estamos juntos...
      Abç, Fernando

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