sexta-feira, 26 de abril de 2013

O Maracanã é deles!


A reabertura do Maracanã está agendada para amanhã, num evento-teste aberto aos operários que trabalharam em sua reconstrução. Eles vão assistir uma pelada entre os amigos de Ronaldo e Bebeto, membros propagandeiros do Comitê Organizador Local da Copa de 2014.  

O novo Maracanã em pouco tem a ver com o estádio que povoa a memória afetiva de milhares de torcedores brasileiros, demolido segundo a lógica de uma nova concepção de esporte e futebol que, no caso das agora chamadas arenas, se explicita através das exigências e determinações para que possam sediar partidas do mundial, o padrão FIFA

Ocorre que tal padrão está diretamente associado às necessidades de produção e reprodução ampliada do grande negócio que se tornou a Copa. Vale o registro de que a Copa no Brasil vai fazer a FIFA ter um lucro de R$10 bilhões, 36% a mais do que o faturamanto na África do Sul, em 2010, e 110% a mais do que na Alemanha, em 2006.

O objetivo é o superlucro e, para isso, operam a inovação estética, a criação destruidora e a Estado-dependência.

As arenas devem ser construídas com a cara da riqueza, ou seja, com a estética e a condição operacional e técnica para se fazer de uma partida de futebol um grande espetáculo midiático. Assemelham-se, em verdade, a grandes estúdios de TV, isto porque os direitos de imagem e transmissão do mundial constituem a maior fonte do lucro anunciado.

O Maracanã havia passado por duas reforma recentes, uma para o Mundial de Clubes da FIFA de 2000 e outra para o Pan de 2007. Mais de R$ 400 milhões foram gastos, o que não foi suficiente. Feito para durar e em plena atividade, o lendário estádio foi colocado abaixo, preservando-se apenas seu aspecto externo, cujo novo entorno, com a demolição do Museu do Índio, do Estádio Célio de Barros, do Parque Aquático Julia Delamare e da Escola Municipal Friedenreich, vai tratar de revitalizar.

Ao pior estilo da criação destruidora, por dentro e por fora, teremos um outro Maracanã, refeito para lucrar... E quem lucra? 

Sim, já sabemos que a FIFA vai se dar bem. Mas vale lembrar que a entidade não faz a Copa sem o apoio dos Estados nacionais, apoio que se traduz por garantias de financiamento, estrutura e segurança jurídica. 

No caso brasileiro, só o custo para a construção e reconstrução das arenas, segundo dados do Portal da Transparência, é de R$ 8 bilhões, sendo que mais de 90% deste valor é financiado pelo fundo público através do programa BNDES PróCopa Arenas.

O Maracanã, particularmente, já custou R$ 869 milhões ao Estado do Rio de Janeiro, deste total, R$ 400 milhões obtidos a partir de empréstimo junto ao BNDES, R$ 200 milhões junto a Corporação Andina de Fomento e o restante, pagos com recursos próprios do Estado e outro financiamento da Caixa Econômica Federal cujos valores ainda não foram divulgados.   

Ganhou também o Consórcio Maracanã Rio 2014, liderado pela gigante Odebrecht que, para além da construção do Maracanã, da Arena Corinthians, da Arena Fonte Nova e da Arena Pernambuco, atuando nas áreas de engenharia, construção, imobiliária, energia, petróleo e gás, logística, defesa e concessões, possui vários outros contratos de obras públicas no Brasil e negócios em mais de 30 países.

E quem tende a ganhar a partir de agora é a IMX, empresa de Eike Batista que, junto com a própria Odebrecht e a Anschutz Entertainment Group, multinacional da área de entretenimento esportivo, formaram um outro consórcio, o consórcio Maracanã SA, favorito para vencer a licitação de concessão do Maracanã.

Os valores que envolvem a concessão - leia-se, privatização - foram muito bem apuradas pelo Comitê Popular Rio Copa e Olimpíadas e indicam um lucro de R$ 3 bilhões para o consórcio. Por sua vez, pela cessão, o Estado do Rio de Janeiro receberá 33 parcelas de R$ 7 milhões, o que não paga nem o juros dos empréstimos contraídos para sua reconstrução.

É um negócio e tanto para a IMX e cia.

A empresa do Grupo EBX foi criada em 2011 e já é dona de uma série de eventos no Brasil - a exemplo do UFC, Volvo Ocean Race, LPGA Brasil Cup, Mundial de futevôlei 4×4, Travessia dos fortes, Megaramp e Rio Open -, gerencia a carreira de atletas - como Torben e Lars Grael, a saltadora Maurren Maggi, o surfista Gabriel Medina e o craque Neymar, dentre outros - e é "irmã" e gestora dos contratos de patrocínio do RJX, time de vôlei atual campeão da superliga.

Com a concessão do Maracanã, a IMX dá um novo salto em direção a concentração e centralização de capital esportivo. Eike está rindo a toa... 

“Vamos trazer para o Rio de Janeiro os eventos de esporte e aumentar a auto-estima carioca. Queremos promover a alegria para os outros e, com a Copa e as Olimpíadas, o momento foi propício. Vou me divertir com isso.”, disse 

O empresário já é tratado como o novo Rei do Maracanã. Foi-se o tempo que se conquistava este título na bola, talvez por isso Zico e Romário vão ficar de fora do evento-teste. A campanha O Maraca é nosso! mobilizou a sociedade, sensibilizou a opinião pública, pautou a necessidade de democratização do esporte e expôs as negociatas envolvendo sua privatização, mas, infelizmente, o Maracanã está mudando de mãos. 

Pode até ser nostalgia, mas as imagens memoráveis do Maracanã mágico, público e popular de que fala Chico Buarque, infelizmente, não voltam mais, vão ser comercializadas no museu ao lado. 

Revoltante!

6 comentários:

  1. È incrivel como se gastam milhões e milhões com os eventos FIFA e Olimpiadas.Enquanto isso, resta-nos contar com a bondade divina para um dia 10% deste valor gasto com essas obras faraonicas serem investidos para construção de centros olimpicos para formação de novos e futuros campeões!

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    1. Olá Antônio,

      O Ministério do Esporte divulgou recentemente a construção, em parceria com os municípios, de 300 CIEs, Centros de Iniciação ao Esporte, um investimento de R$ 800 milhões. Tenho dúvidas, no entanto, se é esta a melhor política para se democratizar e tratar o esporte... 10% por 10%, digamos que sou mesmo a favor é do investimento de 10% do PIB em educação... entre o campeão e o cidadão, melhor priorizar o cidadão, mas esta é uma outra conversa....

      Abraço, Fernando.

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    2. Opa, bom saber q vcs do Labomídia estão acompanhando o blogdomasca, isso só aumenta a responsabilidade. Abçs, Fernando.

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  2. Enquanto o Brasil não priorizar Educação, Saúde e Transporte, as coisas ainda vão ser assim. O que mais revolta é saber que o povo, mesmo sofrendo e tomando na tarraqueta, vai aplaudir e continuar torcendo pelos nossos atletas. Não que isso esteja errado, mas seria bom ver a mesma mobilização para outras questões de interesse coletivo. Ver os moradores de um bairro se juntarem para pintar ruas com as cores do Brasil mostra que temos capacidade, mas não entendo por que param por aí. União também para cobrar de nossos governantes melhorias nos setores básicos (Educação, Saúde, Transporte...)!!!
    Eu quero ver o "legado" da Copa.

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  3. É "Fareano",

    Concordo contigo, bom seria ver uma maior mobilização em torno dos problemas e contradições envolvendo a organização da Copa. Tratei deste tema em postagem específica, "Copa pra quem?".

    Veja em: http://blogdomasca.blogspot.com.br/2013/01/copa-pra-quem.html.Abra

    Abraço, Fernando

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